Observa-se, nos dias de hoje, um pudor, um embaraço pela inteligência. Demonstrar competência ou inteligência por meio de opiniões ou explanação de factos é visto como algo profundamente negativo.
Como exemplo, podemos dar o caso do aluno no Ensino Superior que comete erros de ortografia. Alguém acredita que um aluno no Ensino Superior dê erros ortográficos? Obviamente que não! Este aluno está apenas a ser humilde, a demonstrar que na verdade só sabe que nada sabe.
Um outro exemplo. Um aluno no Ensino Superior que precise de recorrer a uma máquina de calcular para dividir nove por três. Alguém acredita que este aluno necessita realmente da máquina? Obviamente que não!
Na área dos gostos, observamos mais exemplos, quiçá mais pertinentes. Não é permitido gostar de qualquer coisa. Se vos acontecer o azar de gostarem dum Bergman, de um Kar Wai, duma Fitzgerald ou dum Yo Yo Ma, ou dealgo cuja fonética seja similar, enfim, se vos acontecer o azar de gostarem de alguma coisa que não tenha sido feita para a carneirada, e falarem sobre isso, vocês estão, e perdoem-me a vulgaridade do vocábulo, tramados. O primeiro sintoma é o insulto, são marcados como intelectualóides e daí para a frente é só a descer.
Tendo reflectido sobre tudo isto, dei por mim a observar os estratagemas que as pessoas criaram para ultrapassar este problema.
E reparei, infelizmente a ideia não é minha, que a solução está no facto de sempre que disserem algo inteligente devem acrescentar rapidamente eu tenho uma conta no hi5.
Por exemplo, numa conversa:
"Gosto particularmente do tempo que o Bergman leva para desenvolver cada cena. Eu tenho uma conta no hi5"
Ou então:
"A educação está caótica, os alunos guiam-se pela máxima do menor esforço, do facilitismo e colocam a culpa nos professores. Eu tenho uma conta no hi5"
Ou ainda:
"Fazer uma avaliação, com perguntas de interpretação de um texto de escolha múltipla é abjecto. Eu tenho uma conta no hi5"
E pronto, com esta frase, qualquer elevação ou demosntração de inteligência é remetida ao nível próprio, estimulado pela nossa sociedade. E é, principalmente, uma forma de se resguardarem de impropérios e insultos.
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2 comentários:
Não é má ideia. Curiosamente, o uso da mesma frase quando se diz uma coisa muito estúpida também tem o efeito de evitar insultos (ver post acima)
Se bem que neste caso acho que é porque as pessoas pensam: "não vou insultar um atrasado mental".
Não só apreciei como passarei a tomar como meu. Passo a exemplificar:
A minha tese de mestrado incide sobre as representações e práticas dos magistrados em decisões de adopção. Eu tenho uma conta no hi5.
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